Inovação Para O Entretenimento

Enviado por Mônica Herculano • julho 17, 2015 • Cultura & Mercado

ong-midias-sociais-marketing-digitalAté 2019, o total da receita global do mercado de mídia e entretenimento deve aumentar mais de 5,1%, passando de US$1.74 trilhões em 2014 para US$2.23 tri em 2019. No Brasil, esses valores devem ser ainda maiores do que a média global, com estimativa de crescimento de 10,2% no mesmo período – de US$42 bilhões para US$69 bilhões.

Os dados são da 16ª edição do relatório Global Entertainment and Media Outlook 2015-2019, da PwC, que analisa gastos dos consumidores e investimentos em publicidade em 13 segmentos, incluindo música, rádio, TV por assinatura, livros, filmes e games. Participam do levantamento 54 países. Em termos gerais, o Brasil ocupa a 8ª posição no ranking global – a liderança é dos EUA, seguido por Japão, China, Alemanha e Inglaterra.

Um dos destaques diz respeito aos gastos para acesso à internet no Brasil, que deve alcançar US$ 29 bilhões em 2019, com crescimento médio de 17,1% ao ano. Já as despesas com internet móvel devem ultrapassar a faixa ainda em 2015, ficando 2,3 vezes maior em 2019. O investimento e o avanço na infraestrutura e a ascensão das classes C, D e E são os principais responsáveis por esse crescimento, segundo a especialista em entretenimento e mídia Gardênia Rogatto, gerente sênior da PwC Brasil. “É todo um contexto que faz com que esse número cresça. Cada vez mais as pessoas estão comprando smartphones, e isso impulsiona o consumo do entretenimento”, explica.

A crise econômica pode impactar nesse consumo nos próximos anos. Gardênia conta que, das projeções da pesquisa anterior da PwC, o Brasil teve uma queda de US$ 3 bilhões. No entanto, ainda que de maneira mais moderada, as pessoas continuam consumindo. “Se eu sou cinéfila, quero assistir filmes, ao invés de ir todos os finais de semana ao cinema, vou uma ou duas vezes por mês”, exemplifica, lembrando que o consumidor também busca alternativas mais baratas, como ver filmes em plataformas de streaming.

Embora o ritmo de crescimento da receita global do mercado de mídia e entretenimento seja variado – o Japão, por exemplo, por já ser um mercado maduro, representa o menor avanço; já a Nigéria tem crescimento mais acelerado –, a projeção mostra que, quando os consumidores ao redor do mundo se tornam conectados, seu comportamento também fica semelhante. As duas principais diferenças são: a qualidade da infraestrutura disponível para acessar o conteúdo e o desejo por experiências pessoalmente relevantes.

“Com a proliferação de conteúdo e as opções de acesso, os consumidores buscam, cada vez mais, flexibilidade e liberdade, ou seja, escolha do que, quando, onde e como consumir. Ao fazer essas escolhas, vão migrar para as opções que combinam relevância e conveniência, ou seja, que oferecem conteúdo atrativo e proporcionem uma melhor experiência dentro das suas expectativas”, destaca Gardênia.

Inovar é preciso – Em outras palavras: a diferença entre quem vai sobreviver – e crescer – e quem não vai tão longe nesse mercado será a qualidade do conteúdo e as melhores formas de chegar ao consumidor. “Empresas de mídia e entretenimento precisam adotar a experiência de consumo como fator crítico de sucesso”, ressalta a sócia da PwC Brasil, Estela Vieira. “O que conta é a habilidade de combinar conteúdo com a experiência de uso. Para isso, é preciso inovar no desenvolvimento do produto, desenvolver canais variados e interligados de relacionamento com os consumidores e, por último, colocar o acesso móvel no foco dos negócios”.

Mas nem todos aceitam trabalhar em terreno móvel. “Ter o consumidor na sua casa dizendo os caminhos a seguir ainda tem que ser assimilado”, diz o consultor em comunicação e mídia José Reinaldo Gomes, da Casa dos Meios. Para ele, todos estão abertos a novidades, mas será preciso criar uma cultura de produção de conteúdo de forma contínua, já que há empresas de diferentes setores desenvolvendo conteúdo e experiências, mas ainda aos soluços. “Gerar conteúdo relevante não é fácil. As empresas, as agências e os veículos estão atentos e aprendendo juntos a fazer isso, mas será preciso se capacitar bastante e evoluir em aprendizados ao atender diferentes segmentos de público. A situação é complexa e exige atitude, investimento e tempo.”

Para Rodrigo M. Terra, diretor de negócios e parcerias da Associação EraTransmídia, o Brasil tem criado bons conteúdos e experiências de mídia e entretenimento para o público, se pensarmos que por aqui já existem alguns players estabelecidos – que produzem em escala suficiente para atender, por exemplo, a janela de oportunidades que a Lei 12.485 deu para o público da TV paga poder consumir mais conteúdo nacional. Por outro lado, segundo ele, não temos ainda conteúdos de entretenimento que tenham boas experiências cruzadas de mídias.

“Ainda se olha muito para projetos que viram um único produto distribuído por ‘n’ mídias diferentes, mas que não exploram o melhor de cada uma delas. Apenas são adaptados e replicados. É errado? De jeito nenhum. A lucratividade vem dessas receitas. Mas e toda a propriedade intelectual gerada? Deter muito além de formatos, mas personagens, histórias e universos narrativos não abre potencial para se trabalhar a experiência de mídia como uma porta de entrada para uma riquíssima franquia?”, questiona.

Outra questão, coloca o especialista em entretenimento e mídia e fundador da agência NoPlanB, Pedro Tourinho, é a dependência das leis de incentivo, que deixam as iniciativas de entretenimento sempre atreladas ao departamento de marketing dos seus patrocinadores. “Muitos desses conteúdos e experiências mais personalizadas de consumo acabam por ter cara, jeito e formato de ação promocional. Parece, e é ação promocional. Há exceções, mas que normalmente acontecem à margem das leis de incentivo, com pouco ou nenhum dinheiro de patrocínio e, portanto, para um público menor.”

Ele acredita que falta público para consumir a cadeia completa de produção de conteúdo. “Em outras palavras, a cauda longa no Brasil é economicamente inviável”, diz, e afirma que falta uma variedade maior de canais com poder de público, para viabilizar mais produções, e falta dinheiro livre para financiar experiências mais inovadoras e de maior risco. “O mercado de entretenimento do Brasil é um mundo, mas a infraestrutura que o atende é modesta, centralizada e conservadora.”

Não cooptar os novos talentos que vêm criando conteúdo interessante, para transformá-los em versões diluídas de seus próprios conteúdos originais, é outra falha no mercado brasileiro, de acordo com o jornalista Alexandre Matias, responsável pelo site Trabalho Sujo e especialista em cultura, comportamento, ciência e tecnologia. “Isso aconteceu antes da internet, quando VJs da MTV Brasil foram parar em canais abertos, e depois dela, principalmente com a própria MTV Brasil em seus últimos dias, contratando celebridades da internet brasileira, e a safra de humoristas que se consagrou no YouTube ganhando programas de televisão”, exemplifica.

Ele lembra que há uma geração inteira produzindo conteúdo para públicos de milhões em seus sites, canais de YouTube, blogs e páginas de Facebook. Alguns deles, como os sites Jovem Nerd e Omelete, saíram do mundo virtual e promovem eventos e encontros presenciais, reunindo milhares de pessoas em diferentes cidades do Brasil, completamente alheios ao que acontece na TV, nas revistas e nos jornais. “Esses novos nomes estão cada vez mais ignorando a mídia tradicional, pois perceberam que não precisam dela para sobreviver. Infelizmente há gerações anteriores a esta nova safra que poderiam estar com seus próprios negócios e gerando conteúdo fora do mainstream há mais tempo, mas não têm essa garra de empreendedorismo.”

Para quem tem coragem – Para Matias, os anunciantes estão procurando novos veículos, e o público, apesar da crise, ainda tem dinheiro para gastar. Além disso, há novas de financiamento sendo criadas com uma frequência cada vez maior. “O que acontece, pelo que vejo, é uma crise de autoestima e de insegurança, que faz com que provedores de conteúdo sintam medo de investir nos próprios negócios”, avalia.

Segundo Gardênia, o estudo da PwC confirma que o consumidor paga por conteúdo de qualidade e pelo que seja relevante aos seus interesses. Por isso, volta à orientação: as empresas devem, cada vez mais, entender o comportamento do consumidor e buscar a customização e a inovação dos serviços onde for possível.

Rodrigo M. Terra indica que o ciclo de inovação se dá com boas ideias que viram prática, em um espaço aberto para pesquisa e desenvolvimento e com segurança para experimentar e colher resultados que ainda não são mensuráveis pelas métricas disponíveis hoje. Isso exige um nível de amadurecimento das empresas e do mercado que ainda começa a surgir no Brasil. “Acredito que falta mais educação sobre esses temas, formar melhor e atualizar os profissionais das diversas áreas que compõem nosso mercado, trazer a discussão para o cotidiano das empresas de maneira mais científica e prática, ousar e ser ousado na hora de colocar pilotos na rua, ter uma margem de ‘insegurança’ para poder arriscar e potencialmente desenvolver novos negócios”, ensina.

CEO da UBE Entertainment, que desenvolve formatos para TV e novas mídias e tem sede na Espanha, Flávio Mendes acredita que falta foco, leitura madura do mercado decisor e coragem para a união de talentos e formação de uma nova indústria no Brasil. “Somos um dos melhores e mais criativos tradutores do cotidiano de todo o mundo. Mas as produtoras e toda a cadeia desse mercado ainda são muito dependentes da demanda. Poucos sabem criar oferta de forma profissional e qualificada. Imagina se as empresas produtoras do setor no Brasil se unissem e criassem o seu próprio canal de entretenimento? Se abrissem espaço para algumas pequenas empresas de grande talento específico, ou ainda com seus pares regionais, nas cenas culturais de relevância no país? Um polo formador em parceria com o universo acadêmico ampliado para setores de mercado, do direito e de economia? Creio que é a prova final que falta, para quem pode comprar e decidir, acreditar nesta capacidade da nova indústria do entretenimento brasileira”, provoca.

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