“NINGUÉM SE TORNA LÍDER LENDO UM LIVRO”

O AMERICANO JAMES HUNTER, AUTOR DO BEST-SELLER O MONGE E O EXECUTIVO, LANÇA DE VOLTA AO MOSTEIRO PRIMEIRO NO BRASIL, ONDE VENDEU 80% DOS EXEMPLARES DO ANTERIOR. EM ENTREVISTA À NEGÓCIOS, ELE QUESTIONA A FORÇA DE VONTADE DOS GESTORES
hunterJames Hunter (Foto: Sextante/Edilson Dias)

Toda vez que o escritor americano James Hunter vem ao Brasil, escuta a mesma pergunta: por que seus livros vendem tanto por aqui? Os dois anteriores, Como se Tornar um Líder Servidor e O Monge e o Executivo, tiveram 80% de seus exemplares vendidos no Brasil (o equivalente a cinco milhões de cópias). Em sua 25ª passagem pelo Brasil, para o lançamento do novo livro, ele arriscou outro palpite para o sucesso com o público local: “Acho que meu livro faz tanto sucesso aqui por causa da esperança dos brasileiros”, afirmou em entrevista à NEGÓCIOS. “A esperança em relação a uma mudança no estilo de liderança.”

De Volta ao Mosteiro (Editora Sextante) mostra o retorno do protagonista da ficção, o executivo John Daily, ao mosteiro que visitou por uma semana no livro anterior. Nessa volta, ele lamenta que não conseguiu colocar em prática os conceitos de liderança que aprendeu na primeira temporada. “É duro ser um bom líder”, diz Hunter. “Tem que fazer um esforço enorme”. Segundo ele, a principal dificuldade é que, em geral, as pessoas querem mudar o mundo, sem mudar a si mesmas. “Não basta reclamar do chefe ou do político – tem que chegar em casa e ser um bom pai, filho, amigo, líder.”

A seguir, ele antecipa – e reforça – algumas das lições do novo livro. De Volta ao Mosteiro será lançado primeiro no Brasil.

Por que é tão difícil agir como um líder servidor no dia a dia das empresas?
Porque nós somos criaturas de hábitos. Temos os mesmos comportamentos durante toda a vida. Um gerente de 30 anos de idade e dez de carreira, que não sabe reconhecer o trabalho dos subordinados, não os ajuda a agir com excelência, que permite a existência da mediocridade, está habituado a agir assim. Você realmente acredita que ele vai mudar porque leu meu livro? Ninguém nunca se tornou um líder melhor lendo meu livro ou assistindo às minhas palestras. Não há atalhos. Não existe um pó mágico. É duro mudar. Demanda muito esforço. Mas é possível. E esse esforço tem sido feito por um monte de bons líderes que conheço.

O que eles fizeram de diferente da maioria para ter sucesso?
Você tem que fazer a escolha e ter a disposição para mudar. Quando lê um livro, você tem alguns pensamentos, que podem se tornar ações. Mas, para isso, tem que decidir. Ações se tornam hábitos. Hábitos se tornam seu caráter. Seu caráter se torna seu destino. Nós nos tornamos o que praticamos repetidamente. Liderança é uma habilidade aprendida. Nós dizemos que acreditamos nisso, mas não sei se realmente acreditamos. Pense em um músico, um jogador de futebol ou de golfe. Você poderia aprender a tocar piano ou se tornar um ótimo jogador de futebol lendo livros sobre o assunto? Pode se tornar um jogador de golfe assistindo ao Tiger Woods jogar? Você até pode aprender sobre piano, futebol e golfe. Mas se quiser ter um ótimo desempenho nessas áreas vai ter que praticar. Muito. De novo e de novo.

O que exatamente tem que se praticar para ser um bom gestor?

Por exemplo, eu encontro chefes que não elogiam suas equipes. Nunca têm uma boa palavra para dizer aos funcionários. Isso não significa que esses líderes sejam más pessoas – eles só têm maus hábitos. O que podem fazer sobre isso? Podem definir que vão elogiar sinceramente duas pessoas por dia no escritório. Para gerenciar a mudança, no fim do dia, eles anotam em suas planilhas quem elogiaram e o que foi dito. São duas pessoas por dia, dez por semana, 130 a cada trimestre e 500 por ano. Eu vi líderes muito ruins se tornarem ótimos. Você acha que as pessoas não podem mudar? Estamos errados de pensar isso. Elas podem. O que está errado é pensar que isso é fácil.

Que outras ferramentas você sugere para haver uma mudança real de comportamento?

Sugiro três regras. A primeira é entender que todos nós temos questões. Há uma distância entre o que nós precisamos ser, como líderes, e o que nós somos, de fato. As lacunas entre essas duas coisas são as suas questões. Se você pensa que não tem questões, isso é mais uma questão. Aliás, é a pior de todas.

A regra número dois é que todo o resto das pessoas sabe sobre suas questões. Você pensa que sua equipe não sabe? Pensa que sua família não sabe? Elas sabem. E se você pensa que não, faça uma pesquisa e eles vão lhe dizer. Pense no seu chefe ou nos professores ruins que tinha na escola, por exemplo. Todo mundo sabe quem são eles e o que fazem de ruim. Nós passamos metade das horas em que estamos acordados no trabalho. Você acha que existem segredos? Não há segredos.

Regra número três: por que você não faz algo a respeito dessas questões? Por que não pega alguns feedbacks, faz um plano e, com isso, muda alguns comportamentos? Por exemplo, o líder senta em frente à sua equipe e mostra seu plano: “Vou trabalhar nessas questões. Porque vocês todos disseram que eu não os levo em consideração, que eu aceito mediocridade. Não vou fazer mais isso. Aqui está meu plano. E vocês têm permissão de vir ao meu escritório me falar quando me virem fazendo isso.” As pessoas levam a sério mudar nessas circunstâncias. Porque não há mais onde se esconder.

Mas falar a verdade para os chefes não é algo fácil. Até porque muitos dizem querer ouvir, mas algumas pessoas não confiam nisso. Sentem medo de sofrer punições se o fizerem.
Os líderes têm que descobrir maneiras de conseguir que as pessoas digam a verdade. Crie métodos anônimos, confidenciais, se for o caso. Quando presto consultoria às empresas, temos questões sobre os líderes que os funcionários respondem anonimamente: “Você confia no seu chefe? Ele é paciente? É educado? Sabe escutar? Ajuda as pessoas a atingirem a excelência? São líderes que você se sente seguro de seguir?”. As pessoas precisam de feedback. Eu conheço líderes que pensam que estão fazendo um bom trabalho, que as pessoas estão motivadas e gostam deles, e eu penso: “Ai, meu Deus. Você está de brincadeira?”. Tem um monte de líderes que não tem ideia de quanto as pessoas pensam mal deles. Eles precisam de feedbacks uma ou duas vezes por ano de toda a equipe, de seus pares.

Você disse que as pessoas não mudam lendo livros, mas já recebeu retornos de leitores que disseram ter mudado a partir da leitura de seus livros?
Algumas pessoas vão mudar apenas lendo o livro. Devo dizer isso. Mas só 10% delas, no máximo. Chamamos esses casos de reação emocional significativa. Eu recebo e-mails dessas pessoas: “Ai, meu Deus! Jesus… Eu vou mudar.”. E elas realmente mudam. Mas 90% de nós – eu incluído – precisam de um empurrão. Precisamos de um plano, de suporte, de alguém perguntando de tempos em tempos sobre seu plano.

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